POETA DE ALUVIÃO
Nasci naturalmente poeta
daí então, na hora certa, deixei-me levar pela mão
Levado demais
fui formalista, menino de mil tradições
Nasci com muitas missões, naturalmente poeta
mas para agradar companheiros
(russos, franceses, ingleses de ocasião)
fui analista, fui esteta
artificialmente cresci
Ademais, aprendi e desaprendi o cansaço das línguas
desumanizei o meu verso
perdi todas as sementes das flores do mal
e o que era pra ser, afinal, não foi
virei uma espécie de sapo-boi alumbrado
Falei difícil, hermeticamente fechado
Falei a linguagem linguagem
ponte e fachada para o nada, lugar nenhum
Hoje eu sou mais um que se despedaça
Minha poética fina, sem substância de massa
não tem como dar às bocas carentes de poesia
o grosso sustento diário de dor e de alegoria
que fazem do homem humano, comedor de feijão,
o inicio e o fim do poema
Levado demais, fui além, deixado levar pela mão
(meus pés já não tocam o fundo do rio)
Poeta para poetas, poeta de aluvião
Dirlen,
ResponderExcluirAchei o poema excelente! Envolve tanta coisa que é até difícil comentar. Fiquei me lembrando dos tempos de Letras no ICHS/UFOP, essa coisa do meio acadêmico versus o poeta.
Por outro lado há detalhes curiosos como a paranomásia em "alegoria", o comedor de feijão que me lembrou o Ferreira Gullar. "Sapo boi alumbrado" é bem Bandeira/Bilac, mas numa dimensão contemporâne. A imagem do ser que despedaça é muito boa.
Parabéns Dirlen! Espero ver o poema publicado em livro em breve!
Abraços do Teixeira.